Por: Aldo Henrique Batista Rodrigues
O atendimento das necessidades e expectativas específicas de clientes e usuários na oferta de produtos e serviços é mais do que nunca um fator preponderante para o sucesso das empresas no mercado moderno.
Entretanto, a autorregulação do mercado para uma oferta justa e transparente de produtos e serviços ainda não é algo consolidado, visto a heterogeneidade significativa nas condições, capacidade e conhecimento dos clientes e usuários para o discernimento de produtos e serviços que irão atender corretamente à sua própria necessidade, principalmente quando falamos de produtos financeiros, uma vez que possuem complexidades, regras e detalhes muitas vezes não conhecidos pelos proponentes.
É no sentido da regulação para defesa e atendimento das necessidades dos clientes e usuários de produtos e serviços financeiros que o Banco Central do Brasil, por meio da Resolução CMN n° 4.949, de 30/9/2021, que dispõe sobre princípios e procedimentos a serem adotados no relacionamento com clientes e usuários de produtos e de serviços, reforça e requer das instituições financeiras a condução de suas atividades com observância aos princípios de ética, responsabilidade, transparência e diligência, propiciando a convergência de interesses e a consolidação de imagem institucional das instituições financeiras e de credibilidade, segurança e competência.
Desta forma, esta norma traz conceitos e requerimentos que visam a equalização do processo de oferta de produtos e serviços a todos clientes e usuários, sobretudo aqueles mais vulneráveis, que, por vezes, por falta de condições prévias, não possuem o conhecimento necessário para discernir as características dos produtos ou serviços financeiros para atendimento à sua própria necessidade.
A norma do Banco Central do Brasil se divide nos seguintes capítulos:
• Dos princípios: no qual são abordados os conceitos que devem nortear o relacionamento com clientes e usuários de produtos e de serviços e os requerimentos às instituições para observância destes conceitos, quais são: i) e promover cultura organizacional que incentive relacionamento cooperativo e equilibrado com clientes e usuários; ii) dispensar tratamento justo e equitativo a clientes e usuários, considerando seus perfis de relacionamento e vulnerabilidades associadas.
Sob a ótica do cooperativismo, estes requerimentos devem ser base inerente do relacionamento com os clientes e usuários dos serviços, sobretudo, por se tratarem, em sua maioria, de associados.
No que tange à aplicação prática destes conceitos nas cooperativas de crédito, a promoção de uma cultura organizacional que promova um relacionamento cooperativo, equilibrado, justo e equitativo com seu associado perpassa por dispositivos de integração da alta governança e da gestão da cooperativa com o corpo técnico de atendimento ao associado, como por meio de treinamentos, webinars, reuniões e outros eventos corporativos que possuam como enfoque a transmissão de valores e enfatização da cultura do atendimento adequado à necessidade de seus associados e que a rentabilização da cooperativa e de seus colaboradores deva ter como meio esse princípio de atendimento de necessidades e não somente o da rentabilização, que deve ser uma consequência e não um fim exclusivo.
• Dos procedimentos: neste capítulo, o Banco Central do Brasil relaciona diversos procedimentos que devem ser assegurados na contratação de operações e na prestação de serviços. Um ponto de destaque entre estes procedimentos é o entendimento da necessidade do cliente, a clareza e transparência na apresentação dos produtos e serviços para atendimento desta necessidade e a qualidade e segurança da contratação.
Para cumprimento destes procedimentos, as cooperativas de crédito devem se utilizar de ferramentas adequadas para realizar o mapeamento do perfil de seu associado ou cliente para compreender a sua necessidade. No dinamismo do cenário atual, não há como se falar de mapeamento de perfil sem a utilização de ferramentas e sistemas eletrônicos, que processam os dados do associado ou cliente, como por meio do seu cadastro ou mesmo por questionários direcionados para entendimento de suas necessidades.
Entendidas as necessidades do associado ou cliente, a oferta adequada do produto ou serviço passa então pela devida preparação do canal de atendimento, que seja eletronicamente ou presencialmente, com especificações claras, completas e íntegras dos produtos e serviços.
Neste ponto, a omissão de características do produto ou serviço pode ser um fator crucial para o insucesso do relacionamento, por tal, a cooperativa deve dispor de procedimentos que deem a maior transparência possível e isto não significa afastar o associado ou cliente da contratação, mas sim direcioná-lo ao que mais lhe seja adequado, por mais que não seja o mais rentável de início. O relacionamento deve ser visualizado sob um prisma mais amplo, associados e clientes mais satisfeitos serão mais fiéis e a fidelização pode ser muito rentável a longo prazo.
Exemplos práticos de procedimentos que possam trazer maior transparência e adequação na oferta de produtos e serviço são: i) formulação de materiais internos que preparem colaboradores de atendimento à esclarecerem adequadamente sobre cada produto e a não se esquecer de detalhes que possam não parecer importantes, mas que os são para a tomada de decisão do associado ou do cliente; ii) documentos eletrônicos com informações claras das condições dos produtos ofertados, como taxas, prazos, custos efetivos, características, condições de cancelamentos apresentados de forma prévia à contratação e que propiciem um tempo adequado de reflexão ao proponente; iii) treinamentos recorrentes aos colaboradores de atendimento aos associados e clientes.
Importante que todos estes procedimentos sejam devidamente evidenciados e observáveis na instituição, sobretudo se tratando de um segmento amplamente regulado.
• Da política institucional de relacionamento com clientes e usuários: consolida todas as diretrizes, objetivos estratégicos e valores organizacionais definidos pela governança da instituição para nortear a condução de suas atividades para o alcance do devido relacionamento com o cliente e usuário de seus produtos.
No caso das cooperativas de crédito, a norma admite que esta política seja unificada para um mesmo sistema cooperativo. Com base nas diretrizes desta política, deverão ser alvo de constante monitoramento pela gestão e administração das cooperativas de crédito, inclusive para avaliar a aderência de seus colaboradores por meio de métricas e indicadores adequados.
Na prática, o relacionamento com associados, clientes e usuários se reflete de forma mais objetiva no seu feedback, que pode ocorrer de diversas fontes e canais, como para reclamações, sugestões ou avaliações. Para cooperativas de crédito, assim como demais instituições financeiras, canais como atendimento ao cliente, ouvidoria, Sistema de Registro de Demandas do Cidadão (RDR) devem ser monitorados constantemente pela gestão e administração da cooperativa, por meio do mapeamento dos resultados ou “feedbacks”, entendimento de causas raízes de situações de reclamações e tratamento por meio do aprimoramento das diretrizes e procedimentos internos, já citados anteriormente. Outras ferramentas de monitoramento e obtenção de avaliações podem ser utilizadas pelas cooperativas para avaliação da satisfação de seu associado, cliente e usuário de produtos e serviços, como pesquisas de satisfação pós - contratação ou durante a condução e vida do produto ou serviços oferecidos.
A adequação, transparência e justiça na oferta de produtos e serviços, conforme tratado na regulação supracitada, vão ao encontro à inerente reciprocidade necessária entre cooperativa e associados e aos princípios do cooperativismo, tais como a educação, formação e informação, a adesão livre e voluntária e a participação econômica, pois as cooperativas existem para satisfazer as necessidades das pessoas e não necessariamente gerar rentabilidade especulativa sobre o capital investido. Sob esta ótica, a governança e gestão das cooperativas devem prover os mecanismos supracitados, por meio de controles, processos e procedimentos devidamente evidenciados e mensuráveis, para salvaguarda do propício relacionamento com os usuários de seus produtos e serviços.
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